Streptococcus
agalactiae (estreptococos
do grupo B) é um coco Gram positivo em cadeia, pertencente ao grupo B de Lancefield,
que leva em consideração o antígeno de carboidrato específico da parede celular;
por isso, é também conhecido como GBS (grupo B de Streptococcus). É uma
bactéria comum dos tratos gastrointestinal e genital, e normalmente não é a causa
de infecções em indivíduos saudáveis, embora possa estar associado a infecções
em idosos, diabéticos e adultos imunocomprometidos (particularmente pacientes
oncológicos), além de representar a principal causa de infecções neonatal em países
desenvolvidos.
Desde 1996
há uma recomendação do American College of Obstetricians and Gynecologist
(ACOG) para o rastreio de colonização em gestantes entre 35 e 37 semanas.
Segundo o último guideline para detecção e identificação de GBS da American
Society for Microbiology (ASM), houve uma alteração no intervalo de gestação
indicado para o rastreio da colonização por GBS, sendo o ideal realizar o exame
entre a 36ª e 37ª semana de gestação, porque verificou-se um melhor valor
preditivo da cultura quando realizada nesse período.
E por que é tão importante fazer esse rastreio em gestantes?
A infecção
por GBS em neonatos é grave, geralmente se apresenta como bacteremia, sepse,
pneumoniae ou meningite. Todos esses quadros podem culminar no óbito do
recém-nascido. A infecção pode ser precoce (até o 7º dia da criança) ou tardia
(que pode ocorrer até o 3º mês de vida), sendo a precoce a mais frequente, transmitida
principalmente durante a passagem através do canal vaginal no parto. Embora
seja menos frequente, a transmissão pode ocorrer também através do aleitamento
materno.
O método
de diagnóstico é a cultura específica para Streptococcus agalactiae de
swab anal e vaginal da gestante. No Brasil, a investigação de colonização por GBS
em gestantes comumente faz parte do pré-natal em serviços de saúde
particulares. No serviço púbico, essa não é a realidade. No Manual Técnico de
Assistência Pré-Natal do Ministério da Saúde (2000), a cultura para GBS não faz
parte do quadro de exames do pré-natal. Mesmo em atualizações das Secretarias
de Saúde dos Estados, não consta como exame obrigatório, e quando pesquisamos
por dados epidemiológicos no país, faltam estudos. Também não há um consenso
nacional para a profilaxia em gestantes colonizadas por GBS, mesmo que a ASM e
outros estudos recomendem o rastreio e a profilaxia antibiótica intraparto para
a prevenção da infeção neonatal.
Como realizar a cultura
para Streptococcus agalactiae?
Duas
metodologias estão mais amplamente difundidas para a realização da cultura para
estreptococos do grupo B: semeadura do swab vaginal e anal (juntos) em caldo
TODD-Hewitt (com colistina e ácido nalidíxico) com subcultivo posterior em Ágar
Sangue ou meio cromogênico; ou semeadura direta em meio cromogênico seletivo e
diferencial para estreptococos do grupo B.
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Meio cromogênico para S. agalactiae. Fonte: Biomériux. |
Na análise inicial em Ágar Sangue, procuramos colônias geralmente beta-hemolíticas, grandes, cinzas, translúcidas. A hemólise do GBS é pequena, bem diferente da hemólise produzida pelo S. pyogenes
(que tem uma colônia pequena e zona de hemólise maior).![]() |
Colônias de S. agalactiae. Fonte: panoramadaaquicultura.com.br |
Às vezes,
pode não apresentar hemólise e, portanto, a identificação é essencial. Ela pode
ser feita por um método simples, chamado teste CAMP. Para este teste, utilizamos
uma cepa S. aureus ATCC 25923, fazendo um traço em Ágar Sangue.
Perpendicular a este traço, fazemos outro com a cepa suspeita de GBS, sem tocar
a cepa de S. aureus. O método consiste na interação da beta-hemólise do S.
aureus com a bactéria em estudo, que apresenta uma proteína de superfície
chamada de fator CAMP, promovendo o aumento da hemólise no local da inoculação. Então,
após incubação, analisamos a formação de hemólise em forma de seta, como na
imagem abaixo.
Existem
métodos alternativos, como semeadura em caldo Carrot ou Granada, e identificação
com teste CAMP rápido, ou ainda automação.
É importante
ressaltar aqui que se forem observadas colônias beta-hemolíticas com CAMP
negativo, é válida a realização de um teste PYR para identificar Streptococcus
pyogenes. Este microrganismo, caso encontrado, deve ser reportado no
pré-natal devido ao risco de desenvolvimento de sepse puerperal.
Devo realizar teste de
sensibilidade? Quais antibióticos testar?
Em casos
de cultura positiva em mulheres na 36ª ou 37ª semana de gestação, a
recomendação é que a profilaxia seja realizada no início do parto com
antibioticoterapia intravenosa (IV). O antibiótico mais frequentemente
administrado é a penicilina, pois isolados de S. agalactiae resistentes
são extremamente raros. Outros antibióticos devem ser testados e reportados no
laudo para opção terapêutica em casos de alergia da gestante à penicilina, como
a clindamicina (deve ser realizado D-teste, com disco de eritromicina).
Embora o
tratamento com antibióticos durante o trabalho de parto possa ajudar a prevenir
a doença de GBS de início precoce em um bebê, este tratamento não previne a
doença de início tardio.
Devo considerar baixo
crescimento de colônias de ,S. agalactiae em urocultura de gestante?
Sim.
Segundo recomendações da ACOG, é necessário reportar QUALQUER QUANTIDADE de colônias,
com presença ou não de leucócitos, em urocultura de gestantes. O antibiograma
também deve ser realizado, e embora a clindamicina não seja utilizada para
tratamento de infecção urinária, deve ser testada (pelo D-teste) e liberada
como alternativa de tratamento em pacientes alérgicas à penicilina.
A via de infecção é
prioritariamente pelo canal vaginal no momento do parto. E se a gestante optar
por cesárea precisa fazer o exame antes do parto?
Sim. O rastreio
deve ser feito por todas as gestantes no período indicado, mesmo se a mulher já
se planejar para o parto cesáreo. O motivo disso é simples: se a mulher estiver
colonizada e o trabalho de parto começar a o saco amniótico (a “bolsa estourar”)
antes da cesárea, a infecção pode acontecer. A profilaxia em caso de cesárea
planejada não é necessária, mas poderá ser reavaliada pelo médico em casos como
esse, e a criança precisará ser monitorada após o nascimento.
Fontes:
Sanches, G. F.et al. Streptococcus
agalactiae strains isolates from cancer patients in Rio de Janeiro, Brazil.
Brazilian Journal of Microbiology, v. 52, p. 303–310. 2021.
Rao, G. G., Khanna, P. To
screen or not to screen women for Group B Streptococcus (Streptococcus
agalactiae) to prevent early onset sepsis in newborns: recent advances in
the unresolved debate. Ther Adv Infectious Dis, v. 7. 2020.
Brasil. Ministério da Saúde.
Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Atenção ao
pré-natal de baixo risco [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde. Secretaria
de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. – 1. ed. rev. – Brasília :
Editora do Ministério da Saúde, 2013. 318 p.: il. – (Cadernos de Atenção
Básica, n° 32)
Brasil. Ministério da Saúde.
Assistência Pré-natal: Manual técnico/equipe de elaboração: Janine Schirmer et
al. - 3ª edição - Brasília: Secretaria de Políticas de Saúde - SPS/Ministério
da Saúde, 2000.66p.
Governo do Estado de Goiás. Secretaria de Estado de Saúde. Pré-Natal. Disponível em:< https://www.saude.go.gov.br/biblioteca/7637-pr%C3%A9-natal>. Acesso em 19 de março de 2021.
CDC. Disponível em: <https://www.cdc.gov/groupbstrep/about/prevention.html>. Acesso em 19 de março de 2021.
American Society for Microbiology Clinical and Public Health Microbiology. Guidelines for the Detection and Identification of Group B Streptococcus. March, 2020.
Group B Strep and Pregnancy. ACOG. Disponível em: <https://www.acog.org/womens-health/faqs/group-b-strep-and-pregnancy?utm_source=redirect&utm_medium=web&utm_campaign=otn>. Acesso em 19 de março de 2021.
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