As infecções do trato urinário (ITU) podem
ocorrer em pessoas de todas as idades e sexo, entretanto, ocorre com maior
frequência em mulheres, devido as características do sistema urinário feminino.
Os principais agentes que causam estas infeções são as enterobactérias, entre
elas Escherichia coli, Klebsiella pneumoniae, Proteus spp e Enterobacter spp. Agentes gram-positivos também podem causar ITU,
sendo os principais os estafilococos, com destaque para Staphylococcus saprophyticus e Enterococcus
ssp.
Estas infecções são classificadas em:
· Bacteriúria assintomática: há presença de
bactérias, mas sem sintomatologia. Achado importante em grávidas e crianças com
refluxo vesicoureteral.
· Cistite: infecção da bexiga com
disúria como principal sintoma.
· Pielonefrite: infecção que acomete rins e
pélvis, com presença de febre e geralmente associada e infecção sistêmica.
· ITU complicada: infecção que
acomete indivíduo com anormalidade do sistema urinário.
Há ainda as ITUs não complicadas, que
geralmente, são diagnosticadas na sedimentoscopia, sem necessidade de cultura.
Pelo fato de que as ITUs são bastante
frequentes, a urocultura é o exame mais solicitado em laboratórios de
microbiologia. A urocultura, portanto, é cultura de urina para identificação de
microrganismos causadores de infecções no trato urinário.
AMOSTRA
A urina de jato médio é a amostra mais comum
para a realização de cultura. Entretanto, pode-se fazer a coleta também de
urina de qualquer jato, urina de paciente com cateterismo vesical, coleta por
sonda de alívio, por punção suprapúbica e amostra de primeiro jato. Para a
utilização destes tipos de amostra, as indicações de coleta devem ser seguidas
criteriosamente, para maior confiabilidade do exame.
CULTURA
A semeadura da urina pode ser feita de duas
formas:
· Quantitativa: com alça calibrada de
platina ou de plástico (de 10µl ou 1µl). Pode ser realizada em MacConkey, CLED
ou meio cromogênico. A interpretação é feita de acordo com o crescimento das
colônias. É importante ressaltar que, se observado cocos gram-positivos no
gram, é recomendado que a semeadura seja feita também em ágar-sangue.
·
Semiquantitativa: com sistema de
laminocultivo. O laminocultivo consiste em uma embalagem plástica cilíndrica,
com um suporte conectado na tampa com duas faces. Em uma das faces, há o meio
CLED (meio que inibe o véu do Proteus spp. e onde é realizada a contagem no
laminocultivo), onde cresce todas as bactérias e na outra face, há o meio de
citrato e MacConkey, um meio seletivo para bacilos gram-negativos. Nesta face,
é possível realizar o teste de indol com reativo de Kovacs, o que auxilia muito
no processo de identificação.
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Laminocultivo e Reativo de Kovacs |
Ressaltamos que a coloração
de gram (já descrita no blog) acompanha todo o processo de identificação das
bactérias causadoras da infecção. Além disso, é importante que o
microbiologista consulte a urina I do paciente, já que o número elevado de
leucócitos e presença de bactérias na sedimentoscopia indicam infecção. É
preciso também levar em conta a sintomatologia, idade, sexo e histórico do
paciente. E com tudo isso, comparar com a contagem de colônias, descartando ou
não possíveis contaminações e infecções verdadeiras.
Para a identificação de
possíveis contaminações, é importante observar a quantidade de leucócitos e
caso haja mais de um microrganismo predominante na placa (com leucócitos
normais), é recomendado que seja pedida uma nova amostra.
INTERPRETAÇÃO E CONDUTA
Para a interpretação das
culturas de urina, podemos entender o seguinte:
· Sem crescimento, sem
presença de leucócitos e com presença ou ausência de sintomatologia: NEGATIVO, e não há infecção.
· Sem crescimento, com
presença de leucócitos, com ou sem sintomatologia: NEGATIVO, mas pode haver sim infecção, como por exemplo por
gonococo, ureaplasma, clamídia, ou o paciente está fazendo uso de antibióticos.
· < 105 UFC/mL, com
ausência de leucócitos, e dois ou mais microrganismos (MOs): faz-se a identificação e leva-se em conta também a sintomatologia
para interpretações mais específicas.
· < 105 UFC/mL, sem
leucócitos, e dois ou mais MOs: faz-se a
identificação. Caso haja sintomatologia, recomenda-se também o antibiograma.
· ≥ 105 UFC/mL, sem
leucócitos, com um ou mais MOs: faz-se a
identificação, e leva-se em conta a sintomatologia para interpretações mais
específicas.
· ≥ 105 UFC/mL, com leucócitos,
com ou sem sintomatologia: além da identificação,
faz-se também antibiograma.
Observações
relevantes:
Ø No gram, a presença de muitas células epiteliais e de mais de um
tipo de MO sugere contaminação de coleta.
Ø Na maioria dos casos, culturas com baixa contagem são negativas.
Entretanto, alguns MOs, mesmo que com baixa contagem, são muito importantes, e
deve-se fazer identificação e antibiograma.
Ø A cultura de ponta de Foley não deve ser realizada, uma vez que o
crescimento de MOs representa a microbiota da uretra distal.
Ø Se houver solicitação de pesquisa de fungos, semear em meios
específicos, como o Saboraud.
Ø A coleta e o transporte são passos muito importantes para o exame,
e devem seguir critérios específicos para um resultado confiável.
Respondendo a pergunta colocada no facebook:
O que fazer quando isolamos um Streptococcus agalactiae
em cultura de urina de jato médio com contagem < 105 UFC/mL, sem
presença de leucocitúria no sedimento urinário?
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Teste CAMP para identificação de S. agalactiae. |
Como dissemos anteriormente, alguns microrganismos são importantes mesmo com baixa contagem. Neste caso, o resultado deve ser
sempre reportado, mesmo na ausência de leucocitúria, pois o Streptococcus do grupo B ou S. agalactiae é um agente importante, principalmente
em grávidas, exigindo intervenção por parte do médico para prevenir infecções
graves no recém-nascido. Neste caso, deve ser feito o diagnóstico do agente e
teste de sensibilidade aos antimicrobianos, para que o tratamento seja
instituído de maneira adequada. Os antimicrobianos a serem testados são:
clindamicina, eritromicina, e penicilina ou ampicilina; os dois primeiros são
drogas de escolha para pacientes alérgicas às penicilinas.
FONTES:
Oplustil, Carmem Paz, et al. Procedimentos
básicos em microbiologia clínica. 3 ed. São Paulo : SAVIER, 2010.
Oplustil, Carmem Paz, et al. Microbiologia
Clínica. Vol 2. São Paulo : SAVIER, 2012.